quarta-feira, 28 de maio de 2014

A Intimidade Além das 4 Paredes - Parte II

Fotos e vídeos de adolescentes e jovens nuas ou seminuas tem se espalhado via Whats App em Goioerê, denunciando a relação de consumo sexual vivenciada na atualidade.


O fenômeno das fotos íntimas e da pornografia caseira disseminadas via whats app, tem escandalizado e gerado muita discussão entre as rodas de amigos em Goioerê. Como comentado na primeira parte da matéria, na edição anterior, embora esta exposição da intimidade seja exacerbada, não deve-se encara-la simplesmente como um ato “promíscuo" de algumas pessoas. Pelo contrário, este fenômeno é um sintoma de como nossa sociedade tem vivenciado o relacionamento entre as pessoas.

Observa-se que hoje, as pessoas vivem relacionamentos superficiais, onde uma pessoa é objeto de prazer da outra, e nada mais. Atributos sexuais são valorizados ao extremo. Hoje, a paquera, o jogo de sedução é reduzido a troca de mensagens e fotos picantes, encaminhando-se rapidamente ao ato sexual. Não há mais tempo para conhecer quem é o parceiro, seus valores, gostos, sonhos, etc. O que tem importado é o atributo sexual. Mulheres fazem dos homens seus objetos e se colocam como objetos aos desejos masculinos. Os homens, por sua vez, tomam as mulheres como objetos se se fazem objetos delas. 

Há hoje uma banalidade das relações e da sexualidade e as pessoas pouco se implicam nas relações e nos relacionamentos. Há uma superficialidade assustadora onde, a mulher, na sociedade machista sai perdendo. O homem que vive a banalidade sexual, tendo relações com várias mulheres (e adolescentes) é exaltado como o “pegador" . A mulher, ao contrário, de objeto desejado passa para objeto descartado; e por conseguinte, vivencia, situações vexatórias, sendo vista como “vagabunda”.  Sua intimidade é condenada quando divulgada nas redes sociais e no whats app.

O que me assusta como profissional na verdade, é em menor parte o fato em si da disseminação da pornografia involuntária ou da pornografia caseira. O pior é a banalidade com que tratamos os relacionamentos, a vida sexual e o próprio corpo. Meninas precisam mostrar o quanto são sexualmente atrativas para serem valorizadas. Faz-se do corpo um objeto, um produto a ser consumido. Ninguém percebe isso e confunde-se o corpo belo com auto-estima ou com realização pessoal. E neste momento desaparece o ser humano em sua essência, e a personalidade dá lugar ao “ser objeto” vazio, que nem atende aos desejos pessoais e tampouco às demandas sociais.

Na verdade, as pessoas usam seu corpo  como propaganda e uma busca superficial de valorização, por meio do consumo sexual. O pensamento é mais ou menos o seguinte: “se sou desejada, tenho valor”. Na busca de afirmação pessoal, o corpo assume o lugar de objeto a ser desejado e  deixa de ser um dos constituintes da identidade da pessoal. E neste momento desaparece o ser humano em sua essência e estabelece-se uma relação de consumo: cada um se coloca ao uso do outro, como se faz com uma escova de dentes, por exemplo. Ou seja, consome-se sexualmente pessoas assim como se consome uma coca-cola, pelo prazer imediato que se tem com este objeto.

Neste sentido as pessoas são consumidas, a intimidade desaparece, o afeto é substituído por prazer. As pessoas começam a esvaziarem-se de si mesmas, e ao mesmo tempo desprezam quem é o outro. Do mesmo modo, a crueldade com que as fotos são disseminadas, mostra o desrespeito com que se tem com o semelhante, e novamente, estas mulheres “produto" são usadas para prazer, admiração, julgamento e escândalo.

Fotos  espalhadas na rede, não podem ser analisadas como uma simples violação do direito do outro ou uma exposição abusiva do corpo. Na verdade são um sintomas de uma sociedade superficial e perdida, onde aprendeu-se a trocar amor por presentes, respeito por recompensas, onde as pessoas são colocadas como objetos a serem usados e não como seres humanos a serem amados. 

É primordial resgatar-se na família os valores humanos como respeito, honestidade e igualdade. É necessário desenvolver a empatia (saber se colocar no lugar do outro) e a valorização das pessoas pelo que elas são, e não pelo que elas tem ou pela aparência. 

Pais e mães: ensinem suas filhas a valorizarem a si mesmas mais do que um corpo a ser admirado. Ensinem-as a se amarem e serem amorosas, generosas, inteligentes, espertas e confiantes. Ensinem-as a serem ambiciosas, mas não para ter somente bens materiais ou status, mas sobretudo para serem mulheres dignas, donas de si, responsáveis e que saibam que seu valor é bem maior do que um corpo a ser exibido. Ensinem-as a serem amadas!




Pais e mães: ensinem os meninos a serem homens dignos, capazes de respeitar uma mulher e ama-la verdadeiramente. Ensinem a valorizar uma mulher pelo que elas são de verdade, abandonando a filosofia hipócrita entre a "mulher santa x vagabunda", pois a mesma mulher que é desejada nas fotos e vídeos do whats app é aquela inferiorizada e desqualificada como vagabunda. Ensinem seus filhos a respeitarem as pessoas como pessoas, não como objetos de interesse. E sobretudo, ensinem através do próprio exemplo de vida!

Precisamos como sociedade, reaprender a respeitar e valorizar nossos semelhantes, precisamos sair das relações pessoais de consumo para relacionamentos pessoas estão inteiramente presentes em seus corpos, emoções e desejos; onde o amor seja vivido em todas as suas esfera, inclusive no respeito!

Iris Schurt 
Psicóloga CRP 08/09802

* Gestalterapeuta - Especialista em Psicologia Clínica, com 11 anos de experiência e atuando há 3 anos em Goioerê.

terça-feira, 15 de abril de 2014

A Intimidade Além das Quatro Paredes - Parte I




Fotos e vídeos de adolescentes e jovens nuas ou seminuas tem se espalhado via Whats App em Goioerê.

O whats app é um aplicativo para celular que permite o envio de mensagens, fotos e vídeos por meio da internet, onde uma mensagem pode ser enviada de um celular para outro, ou em grupos, o que permite a rápida disseminação de uma imagem, vídeo ou mensagem. O benefício da rápida comunicação via whats app também carrega o perigo da propagação de fotos íntimas entre os aparelhos de celulares, tornado-se o principal disseminador de material constrangedor e pornografia involuntária na internet.

Observa-se que várias moças/mulheres, com idades entre 15 e 25 anos, tem fotos suas nuas ou vídeos sensuais espalhados entre os aparelhos de celular da população.
A maneira com que uma foto íntima pode “cair na rede” pode ser diversa e não é um fato isolado em Goioerê. Observa-se que há duas formas principais de uma foto íntima cair na rede: a moça para agradar um namorado ou seduzir um parceiro se fotografa nua e envia para a pessoa. A partir daí é praticamente impossível controlar ou prever o destino destas fotos. O romance pode terminar (ou nem começar) e quem recebeu a foto não respeitar a intimidade que foi lhe foi confiada e aproveita para “compartilha-la” com os amigos, como um troféu onde normalmente ela é admirada pelos seus apelos sexuais e ao mesmo tempo desqualificada como “vagabunda”.
Outro modo, é quando o possuidor desta foto, compartilha a foto com o intuito de punir, agredir ou se vingar da moça.
Há ainda situações onde a própria moça publica suas fotos como meio de promoção pessoal/sexual, como uma busca de admiração ou cobiça dos homens.

Seja estas imagens e vídeos produzidos e divulgados de maneira voluntária ou não, trata-se de observar o comportamento cruel, perverso e banal da nossa sociedade.
Em primeiro lugar há um moralismo hipócrita quanto ao comportamento sexual da mulher, a qual, ao mesmo tempo é exigida de ser sexualmente “liberada" e ativa, e condenada por viver plenamente sua sexualidade. A mulher potencialmente valorizada pelos homens é a mulher gostosa, voluptuosa, sexy em seus microvestidos na balada. De modo contraditório esta mesma mulher é tida como vagabunda, “biscate”, inferiorizada como um objeto de segunda categoria. Há um apelo constante da moda, da mídia e da sociedade para que a mulher seja “gostosa”, e ao mesmo tempo, o vivenciar disto, passa pela condenação social: deve-se parecer, mas não ser. O que isso tudo quer dizer?
Entre outras coisas, percebe-se que não há uma consciência quanto à disseminação destas fotos, com a falsa segurança de que uma foto ficaria restrita a um aparelho de celular, como se isso não fosse diferente de publicar uma foto íntima num outdoor ou na primeira página deste jornal, por exemplo.
Em segundo lugar, observa-se que as relações entre as pessoas tem se tornado cada vez mais superficiais e comerciais, onde o corpo é um objeto de troca e uso, e neste sentido as pessoas tem perdido a noção de que a intimidade é algo que precisa ser preservado e caem na armadilha da publicação de suas fotos e no posterior julgamento da sociedade.
(Esta materia continua na próxima edição)

Cuidados para não “cair na rede”:

  • Se você não tem coragem que a foto/vídeo fosse publicada na primeira página do jornal ou que seja vista por sua mãe, não poste, não envie no whats app e muito menos fotografe/grave.
  • Quando o assunto é foto íntima, não confie. Se o namorado, ficante ou pretendente pedir, ignore. Não se pode contar com a sorte. O cara até pode ser um “santo”, mas nada impede de futuramente ele mudar de idéia e resolver não respeitar mais você. Imagine se o aparelho celular for roubado ou algum amigo resolve fuçar onde não deve?
  • Assim como é impossível recuperar todas as penas quando se abre um travesseiro do alto de um prédio, é impossível controlar o destino de fotos e vídeos na internet. O celular dá uma falsa sensação de segurança de que a foto ficará somente com o destinatário. Mas a segurança é falsa, e a disseminação é real e o julgamento da sociedade é cruel
  • Viva a sua intimidade na intimidade. Assim como guardamos uma jóia cara com o maior cuidado e segurança, nossa intimidade também precisa ser preservada e vivida somente com as pessoas que possam valorizar, respeitar e honrar.